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🎷 Kind of Blue – Miles Davis

  • carlospessegatti
  • há 1 dia
  • 3 min de leitura
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SÉRIE: DISCOS ANTOLÓGICOS


A Melancolia Azul que Mudou o Jazz para Sempre

Lançado em 1959, este disco não apenas marcou uma revolução estética na linguagem do jazz, mas revelou um novo modo de ouvir o tempo, o silêncio e o improviso. Em cinco faixas que parecem suspender a gravidade, Miles Davis e um grupo de gênios abriram portais modais para o infinito.


🔹 Uma revolução silenciosa em azul

Entre tantos discos históricos da música ocidental, Kind of Blue ocupa um lugar singular. Não apenas pelo seu sucesso (é o álbum de jazz mais vendido da história), mas pela maneira com que redefiniu o fazer musical a partir da simplicidade e do espaço. Gravado em duas sessões, nos dias 2 de março e 22 de abril de 1959, com músicos que formavam um verdadeiro olimpo criativo — John Coltrane, Bill Evans, Cannonball Adderley, Paul Chambers, Jimmy Cobb e Wynton Kelly — o disco mergulha na proposta de um jazz modal, onde a improvisação se estrutura não mais em progressões complexas de acordes, mas sobre modos (escalas) que abrem o campo da melodia ao infinito.


Miles Davis buscava, aqui, um despojamento da estrutura harmônica tradicional, rompendo com o bebop e abrindo uma nova dimensão sonora: mais atmosférica, introspectiva e livre. Kind of Blue é, por isso, um manifesto silencioso da liberdade artística e da emoção pura, expressa em cada nota — sem excessos, sem virtuosismo exibicionista. Apenas profundidade.


🔍 Análise faixa a faixa

1. So What

A abertura perfeita para um disco que queria mudar tudo. Uma conversa musical entre baixo e piano (Chambers e Evans) dá início ao tema que explora o modo dórico. A estrutura segue um ciclo modal de apenas dois acordes. Miles introduz o tema com clareza e espaço, como se cada nota respirasse. Coltrane vem em seguida com seu fraseado investigativo, buscando os limites do modo.

Cannonball é mais solar. “So What” é minimalismo emocional. Uma aula de como dizer muito com pouco.


2. Freddie Freeloader

Aqui, Wynton Kelly assume o piano, trazendo um swing mais tradicional e “bluesy”.A faixa se estrutura em um blues de 12 compassos, mas o clima permanece suave e elegante.Miles toca com mais calor, enquanto Coltrane explora caminhos melódicos mais rítmicos. O destaque é o solo de Kelly — clássico e preciso, trazendo o soul do piano à superfície. É uma ponte entre o jazz do passado e a liberdade do futuro.


3. Blue in Green

Uma das faixas mais introspectivas e delicadas de todo o disco.Bill Evans, que provavelmente co-compôs a música com Miles (há debate sobre isso), imprime uma atmosfera impressionista que ecoa Debussy. O tema parece um sopro, uma bruma emocional em que os instrumentos se insinuam mais do que se afirmam. Miles toca com surdina, introspectivo, e Coltrane acompanha com extrema sensibilidade.É uma meditação melancólica, quase existencial. Música que dissolve o tempo.


4. All Blues

Um blues modal em compasso 6/8, que soa como um mantra cíclico.O riff de abertura no piano de Evans cria uma base hipnótica.Miles toca o tema com clareza e nuance, enquanto os solos de Cannonball e Coltrane avançam como ondas que se erguem e se desfazem. É uma faixa onde o grupo mostra coesão e escuta mútua — a improvisação não é competição, mas um diálogo sincero.A repetição nunca cansa; ela aprofunda.


5. Flamenco Sketches

Outra colaboração implícita entre Evans e Davis, essa peça é uma das mais ousadas do disco. Ao invés de seguir uma estrutura harmônica ou forma definida, a peça se baseia em cinco modos diferentes, pelos quais os solistas transitam livremente. Cada instrumento parece caminhar num campo aberto, onde cada frase é descoberta no momento.Evans inicia com acordes espaçados, que criam uma paisagem.Miles, Coltrane e Cannonball atravessam esse terreno sonoro com extrema delicadeza.É uma espécie de epílogo cósmico — fim e recomeço.


📀 Um disco que respira por dentro

Kind of Blue não é apenas um clássico. É um disco que ensina como escutar.

Ele nos convida a perceber as pausas, os vazios, o silêncio entre as notas. Cada música parece estar acontecendo dentro de nós, como um estado de espírito, como uma cor.Esse “azul” do título não é uma cor qualquer. É a cor da alma em suspenso, da nostalgia que não se nomeia, da liberdade que só pode ser dita por quem silencia as regras.


Mais do que uma obra-prima, Kind of Blue é um lugar para onde sempre se pode voltar.E cada retorno é diferente.


 
 
 

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