top of page
Buscar

Análise Minuciosa de "Ideologia: uma introdução" — Marilena Chaui

  • carlospessegatti
  • há 3 dias
  • 5 min de leitura

Atualizado: há 1 dia




Contexto geral:

Publicado inicialmente em 1995, Ideologia: uma introdução é uma obra fundamental para compreender o pensamento marxista brasileiro, especialmente sob a perspectiva da filosofia crítica. Marilena Chauí, renomada filósofa e intelectual de esquerda, propõe uma reflexão sistemática sobre o conceito de ideologia, partindo da tradição marxista, mas também a renovando.


Estrutura do livro:

Chauí organiza seu estudo em torno de três eixos principais:

  1. O conceito de ideologia:

    Ela discute a origem do conceito em Marx e Engels, mostrando como a ideologia opera não apenas como uma "falsa consciência", mas como um mecanismo real que organiza as práticas sociais e institucionais.

  2. A ideologia e a sociedade moderna:

    A autora analisa como a ideologia estrutura o Estado moderno e suas instituições, como o direito, a educação, os meios de comunicação e a cultura de massa, consolidando a dominação de classe.

  3. A naturalização das relações sociais:

    Chaui enfatiza que a função mais insidiosa da ideologia é naturalizar as relações sociais historicamente determinadas, fazendo parecer que a desigualdade, a propriedade privada e a dominação são "naturais" ou "inevitáveis".


🧠 Pontos Centrais do Pensamento de Chauí

  • Ideologia como mediação:

    A ideologia não é simplesmente uma mentira imposta "de fora"; ela é incorporada pelas práticas sociais. Ela constitui subjetividades, produz consentimento e não apenas repressão.

  • Ideologia como ocultamento:

    O papel principal da ideologia é ocultar o caráter histórico, contingente e político das relações sociais, apresentando-as como naturais e eternas.

  • O Estado e o direito como expressões ideológicas:

    O direito, o Estado, a educação e a mídia são instrumentos para reproduzir a ideologia dominante. Chauí sublinha o papel do direito na reprodução do capital.

  • Crítica da consciência liberal:

    Chauí é implacável com a ideologia liberal, que naturaliza a desigualdade como se fosse consequência da "meritocracia" ou da "livre escolha", encobrindo a violência estrutural do capitalismo.


📚 Agora, vejamos Evguiéni Pachukanis em Fascismo:


Pachukanis (1891–1937) foi um jurista marxista russo que desenvolveu uma análise profundamente crítica do direito burguês. Seu livro Fascismo não é tão conhecido quanto sua obra mais célebre (Teoria Geral do Direito e Marxismo), mas é igualmente crucial.


No livro Fascismo, Pachukanis defende que:

  • O fascismo é uma resposta violenta da burguesia em crise, que abandona as formas jurídicas do Estado liberal, embora mantenha a estrutura de dominação de classe.

  • O fascismo não elimina a propriedade privada e nem o capitalismo; ao contrário, o protege através da violência aberta, suspendendo os rituais democráticos que antes mascaravam a dominação.

  • O direito fascista é uma "degeneração" do direito burguês formal: a forma de direito que prometia igualdade e liberdade jurídicas torna-se abertamente desigual, repressiva e brutal.


🔥 Associação entre Marilena Chauí e Pachukanis


1. A Ideologia Jurídica: Chauí e Pachukanis coincidem na crítica ao direito como forma ideológica que naturaliza a dominação capitalista. Para ambos, o direito moderno não é neutro; é instrumento de reprodução das desigualdades sociais.

  • Chauí: Enfatiza que o direito cria a ilusão de igualdade (formal), enquanto perpetua a desigualdade real (material).

  • Pachukanis: Mostra que essa "ilusão" entra em colapso sob o fascismo, revelando o direito como pura violência de classe.


2. A Função Ocultadora: Ambos trabalham com a ideia de que o direito e o Estado operam para ocultar a verdadeira natureza das relações de dominação.

  • Chauí: A naturalização é o motor da ideologia moderna.

  • Pachukanis: No fascismo, quando a crise obriga a burguesia a abandonar a máscara jurídica liberal, a violência latente torna-se explícita.


3. Crítica à "consciência espontânea": Chauí critica como a "consciência espontânea" das massas absorve ideologias dominantes, aceitando-as como naturais. Pachukanis também entende que o direito liberal cria essa consciência espontânea de igualdade, que mascara a desigualdade real.


4. O papel da crise: Ambos percebem que momentos de crise desnudam a função real do Estado e do direito:

  • Para Chauí, a crise pode ser momento de desvelamento ideológico.

  • Para Pachukanis, a crise revela a essência violenta do direito burguês através do fascismo.


 Síntese crítica final:


Tanto Ideologia: uma introdução quanto Fascismo convergem para uma visão materialista histórica da sociedade: as formas políticas e jurídicas, longe de serem neutras ou racionais, são expressões históricas do conflito de classes. Chauí nos alerta para o perigo da naturalização ideológica em tempos de "normalidade democrática", enquanto Pachukanis nos mostra que, em tempos de crise, a burguesia pode lançar mão da violência aberta para manter o sistema — rompendo com as formas jurídicas apenas na superfície, mas preservando seu conteúdo de classe.


Assim, Chauí nos ensina a desconfiar do que parece natural e inevitável. Pachukanis nos ensina a reconhecer que o que parece "exceção" (o fascismo) é, na verdade, um produto lógico da dinâmica capitalista quando em crise.



📖 Marilena Chauí: Atualizações na nova edição de Ideologia: uma introdução


1. Neoliberalismo como nova forma ideológica: Chauí aprofunda a ideia de que o neoliberalismo não é apenas uma política econômica, mas uma verdadeira nova forma de ideologia. O neoliberalismo coloniza a subjetividade, fazendo cada indivíduo se ver como um "empreendedor de si mesmo", deslocando a luta de classes para uma luta entre "vencedores" e "fracassados".


2. Neofascismo como recrudescimento da violência de classe: Chauí observa que a ascensão dos novos fascismos (como Bolsonaro no Brasil e outros movimentos no mundo) revela o esgotamento do neoliberalismo enquanto promessa de progresso. Em vez de igualdade e liberdade, o que emerge é o ódio, o racismo, a misoginia — e a defesa aberta de privilégios.


3. Ideologia da meritocracia e da despolitização: A autora mostra que a ideologia contemporânea opera para despolitizar a vida social: transforma direitos em "méritos" e desigualdades em "falta de esforço", culpabilizando o indivíduo e escondendo as determinações estruturais.


🧩 Quadro comparativo: Marilena Chauí x Evguiéni Pachukanis

Aspecto

Marilena Chauí (Ideologia)

Evguiéni Pachukanis (Fascismo)

Natureza da Ideologia/ Direito

A ideologia estrutura a percepção social, naturaliza desigualdades, organiza práticas cotidianas.

O direito burguês mascara a dominação de classe através da igualdade jurídica formal.

Função da Ideologia/ Direito

Ocultar a origem histórica das desigualdades, naturalizando-as.

Sustentar o capitalismo escondendo a desigualdade sob formas jurídicas neutras.

Modo de Operação

Naturalização, internalização subjetiva, formação de "consciências espontâneas".

Produção de sujeitos jurídicos "iguais" que, na realidade, são desiguais economicamente.

Crise e Desvelamento

As crises podem romper a naturalização, desvelando a ideologia.

Em tempos de crise, o direito formal pode ser descartado em favor da violência fascista.

Neoliberalismo/Fascismo

Neoliberalismo como nova forma de ideologia totalizante; neofascismo como reação à crise do neoliberalismo.

Fascismo como forma de defesa da propriedade capitalista frente à crise do Estado burguês.

Possibilidade de Emancipação

Pela crítica radical da ideologia e rearticulação da ação política coletiva.

Pelo desvelamento da função de classe do direito e pela luta revolucionária contra o capitalismo.


🔥 Aprofundando ainda mais: Ideologia e Forma Jurídica


1. Ideologia como Constituição da Subjetividade (Chauí)

Chauí aprofunda uma visão não mecânica da ideologia: ela não é apenas um “engano”, mas forma a maneira como os sujeitos pensam, sentem e agem. O sujeito ideológico não é consciente da ideologia: sua própria forma de ver o mundo já está estruturada por ela.

Exemplo:

  • Um trabalhador que acredita que sua pobreza é "culpa própria" está agindo sob efeito da ideologia neoliberal, mesmo sem saber.

2. Forma Jurídica como Abstração do Sujeito (Pachukanis)

Pachukanis vai além de uma crítica ao direito positivo. Ele vê o sujeito de direito (o “cidadão”) como a forma jurídica específica da sociedade de mercadorias.


Explicando:

  • Assim como na troca mercantil há sujeitos "iguais" (mercadorias trocadas segundo valor de troca), no direito há sujeitos "iguais" (indivíduos livres e iguais).

  • Porém, a igualdade jurídica é uma abstração: encobre as desigualdades materiais que fundam a sociedade capitalista.

No fascismo, diz Pachukanis, essa máscara é rasgada: a violência pura, estatal, aparece sem mediações.


 Conexão final: Por que juntar Chauí e Pachukanis é tão poderoso?

  • Chauí nos permite entender como a dominação de classe é introjetada e tornada "natural" no cotidiano (a naturalização da exploração).

  • Pachukanis nos permite entender como as estruturas jurídicas (o "Estado de Direito") são moldadas para reproduzir essa dominação, até mesmo (ou principalmente) quando o sistema entra em colapso e revela seu caráter de classe.


Ambos, cada um a seu modo, contribuem para uma teoria crítica radicalmente anticapitalista, capaz de desvendar as engrenagens simbólicas, jurídicas e materiais que sustentam a opressão.


 
 
 

תגובה אחת


אורח
há 3 dias

Muito bons textos, Blavatsky e Chauí

לייק

Site de música

callerajarrelis electronic progressive music

callerajarrelis Electronic  Progressive Music

bottom of page